Você sabe o que é ser traído por  alguém em quem confiava cegamente? Eu sei.
Sabe o que é ser exposto publicamente,  sendo acusado injustamente por pessoas que você amava profundamente? Eu  sei. Sabe o que é preferir calar-se diante das acusações, não por  consentir com elas, mas simplesmente para viver exatamente o que você  pregava? Eu sei.
Você sabe o que é  ser ameaçado de morte à porta da igreja que você pastoreou com tanto  amor? Eu sei. Sabe o que é ter que entregá-la ao grupo dissidente por  causa de ameaças à sua família? Eu sei.
Você sabe o que é ouvir dos lábios do médico que sua filha que  acaba de nascer terá problemas físicos e mentais pro resto da vida? Eu  sei.
Você sabe o que é perder tudo da  noite pro dia por causa de uma convicção e passar a depender de bolsas  de compras de sua sogra? Eu sei. Sabe o que é ter que tirar seus filhos  da escola por não poder arcar com os custos? Eu sei.
Sabe o que é ter uma arma apontada no  momento em que subia o púlpito pra pregar? Eu sei.
Sabe o que é ter sua casa apedrejada por  causa do Evangelho? Eu sei.
Sabe o  que é ver sua esposa sofrer terrivelmente a perda de sua mãe e não poder  levá-la pra sepultá-la por estar legalmente impossibilitado de voltar  ao seu país? Eu sei.
Sabe o que é ser  suspenso de comunhão de sua igreja por algo que não fez? Eu sei.
Sabe o que é ver sua casa se encher de água  até a altura do peito, perdendo muito daquilo que lhe custou anos de  trabalho? Eu sei.
Por que estou  colocando tudo isso aqui? Você vai entender.
Certamente há experiências que você tem tido em sua vida que  eu sequer sonhei passar por elas.
Por  que Deus nos permite viver tudo isso?
Porque o sofrimento visa nos qualificar.
Se não, confira comigo o que dizem as  Escrituras.
Isaías profetiza acerca  de Cristo, chamando-O de “homem de dores, e experimentado no  sofrimento” (Is.53:3). É claro que Seu sofrimento tinha valor  expiatório, o que significa que visava em primeiro lugar o bem alheio.  Entretanto, Seu sofrimento também tinha como objetivo qualificá-lO para  ser tanto nosso Redentor quanto nosso Intercessor. O escritor de Hebreus  diz que Jesus, “embora sendo Filho, aprendeu a obediência por meio  daquilo que sofreu e, tendo ele sido aperfeiçoado, veio a ser o autor da  eterna salvação para todos os que lhe obedecem”(Hb.5:8-9). Mesmo  as tentações pelas quais teve de passar conferiu-Lhe a experiência  necessária para que pudesse “compadecer-se das nossas fraquezas”  (Hb.4:15). Foi por meio de tudo que passou como ser humano, que Cristo  habilitou-Se a “salvar perfeitamente os que por ele se chegam a  Deus, vivendo sempre para interceder por eles”  (Hb.7:25). Interessante isso… Cristo não vive para Si!
Não há dor humana que Ele desconheça.  Quando recorremos à Sua compaixão, Ele sabe exatamente do que estamos  falando. Ele já sentiu na pele o que é ser traído, abandonado,  escarnecido, ameaçado, espancado, tentado, negado, etc. Por isso é capaz  de compadecer-Se de nós. Uma coisa é compreender nosso estado de  miséria. A isso chamamos de misericórdia. Outra coisa é  ter experimentado nossas dores. A isso chamamos de compaixão.  Como Deus, Ele poderia ter misericórida de nós sem ter que descer ao  nosso nível. Mas somente como homem Ele poderia compadecer-Se.
E quanto a nós? Por que temos que passar  por tanta coisa?
Paulo nos oferece  três respostas. Em sua epístola aos Filipenses, o apóstolo dos gentios  confessa:“Sei passar necessidade, e também sei ter abundância. Em  toda maneira, e em todas as coisas aprendi tanto a ter fartura, como a  ter fome, tanto a ter abundância, como a padecer necessidade. Posso  todas as coisas naquele que me fortalece. Todavia, fizestes bem em tomar  parte na minha aflição” (Fp.4:12-14).
Esta passagem nos oferece a primeira resposta. Nosso  sofrimento oferece aos irmãos a oportunidade de “tomar parte” em  nossa aflição. Infelizmente nosso orgulho nos faz sentir incomodados  quando nossa situação desperta compaixão de outros. Queremos ser sempre  pessoas bem-sucedidas que despertem admiração, não compaixão. É por isso  que há tanta gente nas igrejas comendo sardinha e  arrotando caviar. Mesmo comendo o pão que o diabo amassou,  umas preferem ficar caladas, como se tudo estivesse bem, enquanto outras  preferem gabar-se do que não têm.
A  igreja cristã deveria ser um lugar onde se pudesse compartilhar não  apenas nossas boas experiências, mas também nossas necessidades e  frustrações. Parece que estamos mais preocupados em vender uma imagem do  que em transmitir a verdade. Se não expusermos nossas necessidades,  como daremos a outros a oportunidade de exercer o amor?
A segunda resposta que Paulo nos dá está em  sua segunda carta aos Coríntios:
“Bendito  seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias  e o Deus de toda a consolação, que nos consola em toda a nossa  tribulação, para que também possamos consolar os que estiverem em alguma  tribulação, com a consolação com que nós mesmos fomos  consolados por Deus. Pois as aflições de Cristo transbordam para  conosco, assim também a nossa consolação transborda por meio de Cristo.  Se somos atribulados, é para vossa consolação e salvação; se somos  consolados, para vossa consolação é, a qual se opera suportando com  paciência as mesmas aflições que nós também padecemos. A nossa esperança  acerca de vós é firme, sabendo que, como sois participantes das  aflições, assim o sereis também da consolação” (2 Co.1:3-7).
Pode me fazer um favor? Não pule esta  parte! Leia e releia atentamente. Aliás, é um favor que você faz a si  mesmo.
Pena que os movimentos de  prosperidade e fé pareçam ignorar o que Paulo diz aqui. Para muitos,  sofrimento é sinal de incredulidade, enquanto para outros é castigo de  Deus. Precisamos de uma teologia que leve em conta o fato de que “o  que acontece ao ímpio, também acontece ao justo”. A diferença está  na maneira como cada um se porta diante do sofrimento. Quem vive uma  espiritualidade umbigocêntrica fica a se questionar: O que foi  que eu fiz pra merecer isso? Onde está Deus que não intervém? Mas o que  vive uma espiritualidade sadia, voltada para o próximo, se pergunta: Em  que esta situação pode beneficiar a outros?
Como podemos consolar os que sofrem se nunca passamos pelo que  eles estão passando? Se nos portarmos como supercrentes, imunes a todo  sofrimento humano, estaremos agravando ainda mais a dor e a culpa de  quem sofre. Quando revelamos nossa vulnerabilidade perante nossos  irmãos, estamos mostrando que Deus não tem filhos prediletos, e que  ninguém está isento de sofrimento neste mundo, independente de nossa  posição ministerial ou da “graduação” da nossa fé.
Quando escreveu para os cristãos dispersos  por causa da primeira grande perseguição, Pedro declarou: “Amados,  não estranheis a ardente prova que vem sobre vós para vos tentar, como  se coisa estranha vos acontecesse. Mas alegrai-vos no fato de serdes  participantes das aflições de Cristo…” (1 Pe. 4:12-13a). “Coisa  estranha” é um cristão genuíno que não sofra neste mundo.  Afinal de contas, “todos os que desejam viver  piamente em Cristo Jesus padecerão perseguições” (2 Tm.3:12). A  intenção de Paulo e de Pedro é a mesma: consolar os que sofrem. Se está  acontecendo com vocês, saibam que já aconteceu ou está acontecendo  conosco também.
Deus não nos chamou  para o sucesso, mas para a fidelidade à toda prova. Ser bem-sucedido aos  olhos de Deus é o mesmo que ser fiel até a morte.
A terceira resposta está em 2 Co.12:9-10:
“Mas ele me disse: A minha graça te  basta, pois o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza. Portanto, de boa  vontade me gloriarei nas minhas fraquezas, para que em mim habite o  poder de Cristo. Pelo que sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas  necessidades, nas perseguições, nas angústias por amor de Cristo. Pois  quando estou fraco, então é que sou forte.”
É o sofrimento que nos ensina a depender  inteiramente da graça. Aprendemos o quanto somos fracos, vulneráveis,  como “vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus, e  não de nós” (2 Co.4:7). E é aqui que se dá o encaixe  perfeito entre nossa insuficiência e a suficiência de  Cristo. Chegamos ao ponto de sentir prazer no que deveria nos causar  repulsa. Não que o sofrimento em si tenha algum valor, e sim o  sofrimento “por amor de Cristo”. Então, que nos persigam! Que  nos afrontem! Que nos caluniem! Ou até que nos tirem a vida! Que se  cumpra em nós esta palavra:
“Em  tudo somos atribulados, mas não angustiados; perplexos, mas não  desanimados; perseguidos, mas não desamparados; abatidos, mas não  destruídos” (2 Co.4:8-9).
E que  assim sejamos impulsionados a depender mais da graça de Deus do que de  nossas próprias forças.
 

 
 




